domingo, 3 de maio de 2015

MÉDICO E ESCRITOR GOIANO BRILHOU EM SÃO JOÃO DEL-REI POR 15 ANOS


Por Francisco José dos Santos Braga *


Este artigo apareceu originalmente no JORNAL DE MINAS, publicado em São João del-Rei, Ano XV, nº 253, 10 a 16/04/2015, p. 4. 



Cidade de Goiás (31/07/1868) - Rio de Janeiro (02/09/1928)


Nos dias 19  (dia de São José) e 20 de março de 2012, tive a honra de representar o presidente da Academia de Letras de São João del-Rei, escritor José Cláudio Henriques, nas comemorações do 30º aniversário da ALB-Academia de Letras de Brasília, realizadas em auditórios do Parlamundi, sede da LBV, em Brasília. Após a cerimônia protocolar na noite daquele memorável dia, iniciada às 19 horas (com recepção solene pelos Dragões da Independência-DF e sua Banda Musical tocando o Hino Nacional, cerimônia de abertura, outorga de medalha comemorativa a personalidades de destaque, lançamento de livro comemorativo da ALB e obliteração de selo comemorativo pela ECT), fui convidado a participar das comemorações que continuaram no dia seguinte. Às 9 horas do dia 20/3, quando da formação da Mesa, fui convidado a ocupar uma das cadeiras, tendo em vista a histórica cidade de São João del-Rei gozar de excelente e merecida reputação de urbe de elevada cultura e terra natal dos heróis Tiradentes e Tancredo Neves. Naquela reunião oficial foi cumprido o seguinte programa: apresentação do Coral Alegria, execução do Hino Nacional por excelente saxofonista, conferência do pioneiro de Brasília, Dr. Murilo Melo Filho, membro da Academia Brasileira de Letras, outorga da medalha comemorativa aos Acadêmicos da ALB e a outras personalidades do mundo literário e cultural e "in memoriam", cerimônias estas seguidas de um banquete de confraternização.



Tendo comparecido à lauta refeição na hora aprazada, minha esposa Rute Pardini e eu tivemos a grata satisfação de sentar-nos ao lado do Acadêmico Dr. Ático Vilas Boas, de Macaúbas-BA. Apresentamo-nos e, quando me indagou sobre a minha procedência, informei-lhe que viera de São João del-Rei.



Essa informação o impressionou vivamente e ele me perguntou se já tinha pesquisado, nos periódicos da cidade mineira, a obra do goiano Dr. (Antônio Ferreira) Ribeiro da Silva, literato e médico que tinha residido ali por 15 anos. Diante daquela pergunta constrangedora para mim, respondi-lhe que não.



Resumindo, fiquei sabendo que Dr. Ático era o autor do prefácio da reedição de "O APÓSTATA", de SÉRGIO GUIDO (pseudônimo adotado por Dr. Ribeiro da Silva), portanto um especialista. Fui ainda informado que a primeira edição da obra fora incinerada pelo próprio autor, a pedido de um bispo.



Incontinênti, convidei-o para ser colaborador do Blog de São João del-Rei, pedindo-lhe que me autorizasse a publicar o seu prefácio. Para tanto, aguardei a chegada de um exemplar do livro recém-lançado pelo Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, na pessoa de seu então presidente e escritor Aidenor Aires com o prefácio assinado pelo citado Acadêmico. No referido texto, intitulado "Prefácio do Acadêmico Dr. Ático Vilas Boas à recente reedição de  O  APÓSTATA, da autoria de Sérgio Guido (pseudônimo do Dr. RIBEIRO DA SILVA)", o seu autor escreveu:



“(...) Uma valiosa informação biográfica que bem atesta o alto nível dos conhecimentos médicos do Dr. Ribeiro da Silva: o Aspirante Dilermando de Assis foi o autor, em circunstâncias dramáticas, da morte do notável escritor Euclides da Cunha, fato ocorrido a 15 de agosto de 1909, na residência do citado militar, no Rio de Janeiro.

Essa ocorrência desagradável, em que pereceu o eminente escritor, ficou logo conhecida como a Tragédia da Piedade (RJ), estigmatizando, para sempre, um bairro carioca de classe média.
Euclides da Cunha, ao tentar alvejar Dilermando, seu desafeto, não o conseguiu e a bala veio alojar-se na coluna vertebral de Dinorah de Assis, seu irmão e hóspede, deixando-o paralítico.
Na qualidade de militar, foi transferido para São João del-Rei, trazendo o irmão inválido. Atendendo ao pedido de Dilermando, Dr. Ribeiro da Silva examinou Dinorah, solicitando exames radiológicos e outros indispensáveis.

Com a aquiescência do paciente, foi feita na Santa Casa da Misericórdia local a cirurgia para a remoção da bala na espinha de Dinorah.

Dr. Ribeiro da Silva contou, no ato cirúrgico, com a cooperação dos conceituados médicos Dr. Francisco Lafaiete Rodrigues Pereira, mais tarde catedrático concursado da Faculdade Nacional de Medicina (RJ), e Dr. Alceste de Freitas Coutinho. A cirurgia alcançou êxito e Dinorah voltou a andar.¹



Tendo postado o Prefácio de O APÓSTATA, fiquei de certa forma compromissado a pesquisar a obra do meu biografado, pelo menos para dar alguma satisfação a Dr. Ático Vilas Boas sobre o que Dr. Ribeiro da Silva representava na historiografia são-joanense e deixara registrado nos periódicos locais.



É escusado dizer que o presente trabalho é fruto desse incentivo vindo da parte do Dr. Ático Vilas Boas, sendo oportuno dizer que o material que já possuo sobre o Dr. Ribeiro da Silva excedeu todas as expectativas. A sua produção poética se encontra esparsa por periódicos nacionais e nunca foi transformada em livro; mas, por outro lado, posso adiantar que já tenho em mãos poemas maravilhosos compostos por ele e ainda desconhecidos de muitos, coletados no periódico são-joanense A TRIBUNA e em outras fontes. Também posso adiantar que, em São João del-Rei, compôs ele pelo menos duas revistas teatrais, ambas em 1918 e em parceria com Oscar Gamboa:  "MEU BOI FUGIU" (revista de costumes locais, constituída de 1 prólogo, 2 atos, 3 apoteoses e 27 números musicais)  e "VER PARA CRER" (composta de 1 prólogo, 2 atos, 8 quadros e 26 números musicais) , cujo ponto alto foi respectivamente a declamação dos poemas intitulados "Jerusalém" e "Civilização Latina", ambos da autoria de Dr. Ribeiro da Silva (transcritos no mesmo Blog de São João del-Rei ² ). 



Segundo [GUERRA, 1968: 153], no mesmo ano de 1918, dirigiu os destinos do Clube Artur Azevedo (teatro em que eram encenadas as revistas) a seguinte diretoria: Presidente, Dr. Ribeiro da Silva; Vice, Verbino Parizzi; Secretário, Diógenes Melo; Tesoureiro, Adalberto Gonçalves; Procuradores, Oreste Parizzi e Luiz Nogueira. Conforme se vê, Dr. Ribeiro da Silva teve uma vida social muito intensa em São João del-Rei. Participou, por exemplo, de comissão encarregada de organizar o programa das grandes solenidades comemorativas do 1º Centenário da Independência do Brasil, realizadas em 7 de setembro de 1922. Em 30 de novembro de 1922, compareceu, na qualidade de inspetor escolar, à formatura na Escola Estadual João dos Santos e discursou, como paraninfo da turma que concluía o seu curso primário. Nessas oportunidades e em outras cerimônias deste ano de 1922, pôde apreciar os dotes oratórios de dois dos formandos: Tancredo de Almeida Neves (que discursou na cerimônia de plantação de árvores) e Belisário Leite de Andrade Neto (que saudou a Bandeira Nacional e discursou na formatura em questão).



Além disso, o nome de Dr. Ribeiro da Silva integra até hoje a galeria de sócios honorários e beneméritos do Minas Futebol Clube desta cidade.



Por oportuno, quero dizer que São João del-Rei, cidade histórica e cultural por excelência, propiciou ao Dr. Ribeiro da Silva o florescimento de inatos  dotes literários, poéticos e artísticos, que sempre gozaram da parte da crítica local e de seus admiradores os melhores encômios e apreciações.

Quero deixar claro que não sou ingênuo a ponto de não reconhecer que ele os possuísse antes de sua chegada a São João del-Rei (1907). Apenas argumento que esta cidade foi um campo fértil para sua imaginação criadora que era extremamente multifacetada e versátil, já que se tratava de uma pessoa polivalente. Prova disso é que, por exemplo, além de exímio médico (na Europa, em 1899, tomou posse como membro efetivo da conferência Internacional de Bruxelas, na Bélgica, para a profilaxia da sífilis e das doenças venéreas e, no Brasil, colaborava assiduamente para O Brazil-Medico, o que pode ser comprovado através de busca à Hemeroteca Digital Brasileira, da Fundação Biblioteca Nacional), escritor, poeta e teatrólogo. Dr. Ribeiro da Silva ainda pertenceu em 1923 ao diretório local do P.R.M. (Partido Republicano Mineiro). Cabe aqui a observação de que uma importante característica na vida de meu biografado é que ele foi alguém impressionantemente contemporâneo às manifestações e inovações científicas e artísticas no período de sua curta existência (60 anos).



Em reconhecimento aos inestimáveis serviços prestados às diversas causas aqui relatadas, a Municipalidade são-joanense decidiu homenagear o Dr. Ribeiro da Silva com a denominação de uma de suas ruas.



Também a Academia de Letras de São João del-Rei houve por bem homenagear o célebre jornalista, romancista, poeta e teatrólogo, nomeando-o patrono da Cadeira nº 10. O Acadêmico Dr. José Egídio de Carvalho ocupa a cadeira patroneada por Dr. Ribeiro da Silva.
Crédito pelas imagens: historiador Silvério Parada




II.  BIBLIOGRAFIA CONSULTADA


GUERRA, Antônio Manoel de Souza: Pequena História de Teatro, Circo, Música e Variedades em São João del-Rei - 1717 a 1967, Juiz de Fora:  Sociedade Propagadora Esdeva-Lar Católico, 1968, 327 p.

VILAS BOAS, Ático: Prefácio do Acadêmico Dr. Ático Vilas Boas à recente reedição de O APÓSTATA, da autoria de Sérgio Guido (pseudônimo do Dr. RIBEIRO DA SILVA), in http://saojoaodel-rei.blogspot.com.br/2013/07/prefacio-do-academico-dr-atico-vilas.html


 

* O autor tem Bacharelado em Letras (Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, atual UFSJ) e Composição Musical (UnB), bem como Mestrado em Administração (EAESP-FGV). Participa ativamente como membro de diversas instituições de cultura no País e no exterior, cabendo destacar as seguintes: Académie Internationale de Lutèce (Paris), Familia Sancti Hieronymi (Clearwater, Flórida), SBME-Sociedade Brasileira de Música Eletroacústica (2º Tesoureiro), CBG-Colégio Brasileiro de Genealogia (Rio de Janeiro), Academia de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei-MG, Instituto Histórico e Geográfico de Campanha-MG, Academia Valenciana de Letras e Instituto Cultural Visconde do Rio Preto de Valença-RJ, Academia Divinopolitana de Letras, Instituto Histórico e Geográfico do DF, Academia Taguatinguense de Letras, Academia Barbacenense de Letras e Academia Formiguense de Letras. Possui ainda o Blog do Braga (www.bragamusician.blogspot.com.br) e é um dos colaboradores e gerente do Blog de São João del-Rei. Escreve artigos e ensaios para revistas, sites, portais e periódicos.

6 comentários:

Dr. José Antônio de Ávila Sacramento (advogado, escritor, gerente do site Pátria Mineira e membro da Academia de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei) disse...

Prezado Francisco, eu li o seu texto sobre a vida e obra do dr. Ribeiro da Silva (no Jornal de Minas). Parabéns!
Abraço,
José Antônio de Ávila

Gilberto Mendonça Teles (pesquisador, poeta e crítico literário) disse...

Meu caro Francisco Braga,

vi a sua crônica sobre o escritor goiano que morou aí. Quando eu escrevi A poesia em Goiás (com um apêndice sobre escritores de outros gêneros), em 1964, eu não conhecia Ribeiro da Silva, aliás ninguém o conhecia por lá. Sei que mais tarde Ático Vilas Boas Motta, baiano que passou uns tempos em Goiás, o descobriu e, por seu intermédio, o Instituto Histórico e Geográfico de Goiás veio a publicar um romance de Ribeiro da Silva.

É tudo que sei, pois nunca li o tal romance. Abraço do Gilberto Mendonça Teles.

Jota Dangelo (médico, diretor teatral, ator, dramaturgo, gestor cultural e fundador da Escola de Samba Qualquer Nome Serve) disse...

Fiquei impressionado com a figura do médico,teatrólogo,escritor e poeta Ribeiro. Nem sabia de sua existência...Dangelo

Prof. Fernando Teixeira (professor universitário, escritor e membro da Academia Divinopolitana de Letras, onde é Secretário Geral) disse...

Parabéns pelo texto. Abraço do Fernando Teixeira

Maria Andrada (escritora e membro da Academia Formiguense de Letras) disse...

Prezado Francisco,

Obrigada pela oportunidade de conhecer esse brilhante escritor e médico - Dr. Ribeiro da Silva, morador ilustre da bela e cultural cidade de São João del-Rei.
Um abraço,

Maria Andrada

Anônimo disse...

Acadêmico Francisco Braga,

Só você mesmo para trazer a lume, pessoas interessantes, não só para São João del Rei, quanto para nossa cultura no seu todo.Magnifico!O Acadêmico Dr. José Egídio de Carvalho, certamente está somando esta matéria, por se tratar de seu patrono, à sua cadeira. No Minas Futebol Clube, em que o meu falecido pai foi presidente por longo tempo, não havia reparado o seu quadro.

Abs.

Musse Hallak